Judite de Freitas, a 2 de outubro de 2021
O processo de edificação da democracia em Timor Lorosae surge como decorrência da consagração da independência a 20 de maio de 2002, depois do ato referendário de 30 de agosto de 1999, organizado pelas Nações Unidas, que foi favorável à autodeterminação do país. Os deputados da primeira Assembleia Constituinte, eleitos a 30 de agosto de 2001, conquanto representantes do povo, demonstraram determinação na elaboração da Constituição da República Democrática de Timor-Leste (RDTL, 2002), conscientes da necessidade do estabelecimento da Lei Fundamental que garantisse a promoção da cultura democrática e erigisse o Estado de Direito, no respeito pelas instituições timorenses.
A experiência democrática da pequena e jovem nação, no plano do Direito da Educação, no art. 57.º da Constituição da RDTL, atribuí ao Estado “a criação do sistema público de ensino básico universal, obrigatório e tendencialmente gratuito”, assim como a garantia, a todos os cidadãos, de acordo “com as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística”. O princípio da Lei Fundamental acautela o direito de igualdade de oportunidades de ensino e formação.
A produção legislativa em matéria de regulamentação do ensino superior em Timor-Leste aumentou de forma gradual no período pós-independência, decorrente das necessidades de organizar o funcionamento das novas universidades e instituições particulares de ensino superior, nomeadamente a Universidade Júpiter, que, por motivos relacionados com a escassez de meios humanos e recursos financeiros, teve uma existência breve; a Universidade da Paz; a Universidade Oriental; a Universidade de Díli, para além Universidade de Nacional Timor Lorosae, a mais prestigiada e representativa das instituições de ensino superior do País, fundada em 2000, logo após a restauração da independência, assim como do Instituto de Ciências Religiosas “São Tomás de Aquino”, entidade privada que se destina à formação de professores de religião e moral.
Simetricamente, com apoio de instituições portuguesas foi criado o Centro Nacional de Investigação Científica (CNIC). A partir de 2004, as reformas do ensino superior foram permitindo a criação de novas faculdades, a diversificação da oferta formativa, incluindo programas de pós-graduação em diferentes áreas do conhecimento, e isto não obstante a carência de recursos humanos especializados e a escassez de meios financeiros.
Apesar de tudo, durante um período de ca. de sete anos, o sistema de ensino timorense, nos seus diferentes níveis, manteve-se arreigado a procedimentos e modelos, de algum modo, ultrapassados. Foi sobretudo com o IV Governo Constitucional (2007-2012), liderado por Xanana Gusmão, que foi criada uma plataforma de convergência dos programas eleitorais das quatro formações políticas que saíram vitoriosas do ato eleitoral realizado a 30 de julho de 2007. Junto ao processo de consolidação das instituições e participação democrática, na área do ensino superior, o Governo propôs-se criar condições de natureza pedagógica, jurídico-institucional e de recursos humanos qualificados no sentido de proporcionar uma formação universitária de qualidade.
As políticas públicas neste setor viabilizaram a implementação de um modelo internacional de ensino, gestão e acreditação das instituições públicas e privadas. Com efeito, a conceção e aprovação da Lei de Bases da Educação (n.º 14/2008, de 29 de outubro) estabeleceu um quadro de organização geral do sistema educativo nos seus diferentes níveis: ensino básico, secundário e superior; este último compreendendo o ensino universitário e o ensino técnico (art. 17.º da LBE). Por este diploma ficam reguladas as condições de acesso (art. 18.º), os graus académicos e diplomas, nomeadamente bacharelato, licenciatura, pós-graduação, mestrado, doutoramento e investigação científica (arts. 20.º a 26.º), bem como as questões relativas à avaliação e inspeção do sistema educativo (cap. IV, arts. 42.º-44.º). O Estado compromete-se a criar condições de acesso universal e não discriminatório ao ensino superior (ponto 7 do art. 18.º).
Esta lei-quadro dá nota da necessidade de promoção de uma cultura de qualidade e de melhoria contínua no ensino superior, desígnios que vieram a ser complementados com a promulgação do decreto-lei n.º 21/2010 que aprova o regime geral de avaliação do ensino superior e instituí a Agência Nacional para Avaliação e Acreditação Académica (ANAAA), a quem compete aferir a qualidade dos cursos e estabelecimentos de ensino superior de Timor Leste, sob a direção do Ministério da Educação.
Em resumo, boa parte dos instrumentos legais que firmam o regime de ensino superior timorense e lhes conferem um caráter internacional foram lavrados na primeira década da emancipação e autodeterminação do país, facto que reverte para o entendimento da relevância das políticas de ensino superior no desenvolvimento social, económico e comum do País.
Fontes e bibliografia
Fontes
Lei de Bases da Educação, N.º 14/2008, de 29 de outubro, Jornal da República, série I, nº 40. [Em linha]. Disponível em: http://www.moe.gov.tl/pdf/LeiBaseEducacao.pdf
Programa do IV Governo Constitucional [2007-2012]. República Democrática de Timor-Leste Presidência do Conselho de Ministros. [Em linha] Disponível em: http://timor-leste.gov.tl/
Regime Jurídico dos Estabelecimentos de Ensino Superior, Decreto-Lei 8/2009. [Em linha]. Disponível em: http://www.mj.gov.tl/jornal/?q=node/1195
Regime Geral de Avaliação do Ensino Superior (Agência Nacional para a Avaliação e Acreditação Académica (ANAAA), Decreto-lei 21/2010. [Em linha]. Disponível em: http://www.mj.gov.tl/jornal/
Bibliografia
Albino, S. (2020). “(Re)Edificação do Sistema Educativo de Timor-Leste: Evolução e desafios atuais”, Caderno de Estudos Africanos, nº 39, p. 31-55.
Billy, D. L. (2019). Acreditação do ensino superior em Timor Leste: um estudo exploratório, Universidade do Minho, Dissertação de Mestrado. [Em linha]. Disponível em: http://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/63286